sexta-feira, agosto 17, 2007

COMIA LÂMPADAS

Uma menina de linhas densas no rosto, de coração bom e de alegria simples. Um rosto redondo de lua, uns traços orientais. Abraçados, nos encostávamos. Tomava-a, ora pelas costas, toda tocando levemente, ora pelo lado, nos apoiando. Suprimia qualquer desejo. Um toque sensual nada obsceno. Do gosto do corpo amigo, sem malícia. Amigos de rara amizade. Viajávamos num ônibus para algum lugar ao norte do Estado. Goiás, talvez. Nos conhecemos naquela parada.

Entramos numa lojinha de conveniência. Em perfeita harmonia, escolhemos algumas guloseimas. Não me lembro bem, mas pagamos, ou paguei, em perfeito acordo de notas e moedas. Compramos também algumas lâmpadas: podia faltar luz na pousada.

Sentamos juntos, para o meio do ônibus. Algum tempo da partida, ela transbordava sexo. Levantou a saia curta. As coxas clarinhas, a púbis delicada. Meteu a mão, mexia e tocava. Era público! Decidi arranjar o banheiro do ônibus. Concordou transdoidepassivamente. Arranjei briga com o povo do fundão: Um cara tomara a minha vez na merda. Ralhei com outro. Você é folgado, hein cara? Não! Você é que é folgado, meu! Você se acha, hein? Não me achava: tinha certeza. E enfiei esta: todos têm direito de ser filho da puta. Sou filho da puta, e daí? Você por acaso não é? Sou mesmo. Disse mesmo. E tá: o bolo-fofo calou a boca. De volta ao meio do veículo, mal conseguindo, encontrei o lugar vazio. Fui até a frente. O motorista lambia aqueles seios gelatinosos e dirigia.

Saturnina e furiosamente arranquei-a da cabine. Sentei-a. Você gosta mais de mim do que eu mesma. Puxei o saco de comidas. Encarcerada entre a janela e meu aborrecimento, tentava escapar por ela, embora sem ao menos abrir. Ficou quieta e voou. Peguei uma lâmpada. Primeiro, quebrei a abóboda com os dentes. Saía o argônio rarefeito e entrava o oxigênio maléfico. Evitando o filamento, fui quebrando os pedaços de vidro finíssimo e frio, um sorvete de rara espécie, para não cortar a boca. Sem erro no procedimento, utilizava as partes duras da boca contra as pontas, e as curvas contra os arcos dos pedaços. Mastiguei bem. Cuidava pra não machucar o céu, e descuidava pra que machucasse a língua. Suavemente, engoli e ruidosamente me entretive, provando a bile entre uma lâmpada e outra que o gosto do vidro provocava na faringe, totalmente moído. Como restos das guloseimas, sobravam bases metálicas e filamentos.

quarta-feira, julho 11, 2007

Em Busca de Esperança


Encontrei colado num mural de copiadora.

domingo, maio 13, 2007

A vida que foi não foi



Uma desabrochou, linda exuberante;
a outra dobrou, murchosa despetalante.

A rosa, suave amor;
a amarela, bílis-rancor.

Mas o perfume, rancorosa,
exalava a amarela;

A outra, primavera,
não passava de uma rosa.

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Proposta:
Foto e texto integram o poema como partes indissociáveis, ambos de minha autoria.

quinta-feira, maio 10, 2007

A Zona Organizada ou São Paulo Vermelha ou As Paradinha ou A Barba Indignada

Ocorre hoje na Universidade de São Paulo (USP), uma paralização a fim de demonstrar o potencial da grande greve prevista para a semana que vem, que conta com o apoio de professores, funcionários e... alunos.

Como sempre, faculdades gloriosas da USP, como a FEA (Faculdade de Economia e Administração) e a “SanFran” (Faculdade de Direito São Francisco) não movem uma palha, não tomam partido e continuam funcionando. É verdade que o Fórum da Esquerda (“partido” atualmente no “poder” do Centro Acadêmico da “SanFran”) está bulinando com o status quo da faculdade, mas depois de terem me negado o acesso ao seu fórum de discussões do Yahoo, por não ser aluno de lá, mero aluninho da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas), “letras, ainda por cima!”, concluo que não é fórum coisa nenhuma. Esquerda, só se for pra estacionar o carro novo que ganhou do papai.

Um amigo olhos-de-águia, quando perguntado sobre a efervescência fefelechiana nas questões políticas –o que pode ser claramente observado–, disse-me que os sindicalistas são profissionais do oportunismo. E que os estudantes, querendo sempre dar a última palavra, falar mais alto, fazer a afirmação mais forte, embarcam na conversa, tomam pra si as bandeiras. Pura massa de manobra. Opinião nenhuma. Por isso, espero que ter alguma opinião pague por este imaturo ímpeto.

E não são fatos isolados! Isso: acreditem-me louco, paranóico. Em São Paulo, todos resolveram protestar pra ver quem protesta mais. Querem instaurar a zona organizada! Claro, com o 1º de maio por perto. Os professores da rede estadual de ensino e de ensino superior –houve um dia de paralização da USP semanas antes do Dia do Trabalho–, os metroviários, os motoristas de ônibus... ocorreu até um motim na aeronáutica! Como sempre, um bando de estudantes atrás! Por favor, estudante, se não tem opinião, compre uma! Basta assinar TV a cabo. A baixo custo um monte delas, todas importadas!

É verdade que soltam algumas reclamações contra o molusco, mas são raras, imperceptíveis. Por falar no calamares, uma reflexão interessante é que se costumamos trocar os pés pelas mãos, um tal de Lula, tão habilidoso, só podia ter os pés na cabeça (classe Cephalopoda).

Mas para que não tachem de cego, gostaria de inquirir ao leitor sabido porque Suely Vilela (PSDB) simplesmente deixou a bomba da invasão da reitoria da USP (Butantã) cair no colo do pobre fraco, coitado do vice-reitor, nos fazendo acreditar que aquela que vai dar cotas a todos os necessitados –eu, inclusive– estava em França. Agora, de portas escancaradas –destruídas!–, a reitora quer a saída imediata dos “invasores” e diz que vai pensar numa posição quanto aos decretos de Serra. Aliás, as reinvindicações são questão menor. O importante é fazer barulho. Já os invasores da reitoria da UNICAMP –sempre falta aos fefelechinos (sic) originalidade–, te-mi/rri-velmente foram tratados sem negociação, com ameaças de punição severa.

Quanto às razões da invasão, diz a lenda que a reitoria negou diálogo, não compareceu a assembléias ou compareceu de forma prepotente e, por fim, simplesmente fechou todas as portas da Casa quando vieram com documento de reivindicação, o que levou à tomada da bastilha uspiana e à criação das mais cômicas comissões, porém organizadas: limpeza, alimentação, dormitório. O que se poderia esperar de um bando de estudantes? Nada menos do que uma sociedade ideal.

Abaixo o marxismo barato. Abaixo a barba preguiçosa! Se quer ser socialista, sue a camisa. Depois, chegue em casa, tire a vermelha do Che, de camelô, produzida na China, e a boina, faça a barba e vá tomar banho! Depois, reinvente o pensamento. A FFLCH, o coração das humanas, existe pra isso.

Excomunguem-me!

Manchete na Folha de São Paulo: “Papa apóia excomunhão dos políticos pró-aborto”. É pra rir gostoso. Sou de uma família católica. Minha avó, a pessoa mais reta que conheci, sempre me fez enxergar uma Igreja de fé e coração. Agora, vejo o revés da moeda.

O Papa não enxerga que sai perdendo. Aqueles que sempre mantiveram a Igreja fomos nós, homens dedicados, fervorosos, porém conscientes. Se ele não quer ou não é capaz de trazer a discussão para dentro da Igreja e argumentar como igual ao lado da Ciência e da Opinião Pública, se ela deseja expulsar os “hereges”, nós é que vamos expurgá-la da sociedade.

A discussão é válida. Se é verdade que ninguém pergunta ao concebido se quer nascer, ninguém pergunta à mãe se quer ser mãe. Ninguém, do mesmo modo, me perguntou se queria ser católico. E ser católico é uma vida. Deixar de ser demora outra. Discurso retrógrado, machista como sempre, através dos séculos, aceita qualquer maldade por parte dos homens, mas jamais uma atitude concernente à liberdade das mulheres. Excomunguem os assassinos! Excomunguem os homicidas! Excomunguem os papas genocidas do passado. Mas não me venham ensinar discernimento. O óbvio: é que o papa é homem.

Desse modo, finalmente encontrei um modo de arrancar o estigma de católico batizado e crismado, aluno fervoroso do Colégio São José, da Irmandade de Chamberry. Excomunguem-me! Porque não é a Igreja que vai estar me exilando para o Inferno, mas eu que vou exilá-la da minha vida.

Não sou favorável ao aborto, mas não posso aceitar que a Igreja ainda se considere acima de tudo e de todos, e que acredite piamente que vai conseguir aumentar sua influência através do medo. Funcionou na Idade Média: nunca mais. Se ela é incapaz de assumir uma posição flexível, não a queremos entre nós.

É ela que tem medo. Está há mais de um século enfraquecendo. Não quer aceitar seu lugar acessório, sua posição secundária no mundo e nas mentes. Se lhe damos um lugar ao lado da Ciência é por respeito aos grandes homens do passado – a alguns religiosos papas eu ofereço minha tristeza com o rumo atual das coisas –, porque ainda representa o cristianismo, ao qual ela raramente chegou aos pés com seus mantos suntuosos, suas matanças e suas excomunhões e, principalmente, porque o povo ainda precisa dela pra acreditar que a vida não é tão ruim assim – não, não sou socialista.

Não adianta excomungar-nos: pelo contrário, é o que queremos! Assim, quem sabe, mais pessoas capazes de raciocinar saberão que é hora de largar a Igreja aos vermes, para que se destrua, para que as rachaduras terminem por demolir o edifício.

Se ela acha que os pró-aborto são umidade nas paredes, estão enganados. Existem muitos católicos que querem acreditar numa Igreja nova, forte, cristã. Mas está podre. Fundada por Paulo – a Igreja insiste em mentir que foi Pedro –, só podia dar em merda.

quinta-feira, maio 03, 2007

Segredo.

Curte esse segredo.
No teu silêncio.
Não faz barulho, burburinho, olhar-gesto: descomunica-te.
Cala-te verdadeiramente.

Porque só assim você é capaz de saborear uma coisa só tua.
– Amo-te: É lindo o sotaque lusitano...
Apaga, esconde: fecha o caderno.
Não conta a ninguém.

Porque quem conta é você. Nada mais.

25.11.2006

Subi no ônibus



Advertência Inaugural ou Inauguração advertencial

Como sempre, é bom inaugurar. Adoro o novo. E, de certa forma, essas cores novas, esse endereço novo, a vida nova, pedem uma inauguração! Se troco o coluna1.zip.net por problemas técnicos, sinto agora que a mudança vem para melhor. Para renovar, para reavivar e para determinar um marco no meu texto. Sim, sim. Não que eu ache que valha a pena ler sequer uma linha do que escrevo: por favor, não leia nem mais uma letra!

Bom, se continua é porque deseja ler. Apesar da advertência: este texto (e todos os outros que o seguirão) não presta, nem tem essa pretensão. Não merece a sua curiosidade. Serve apenas para - ou ao desejo de - exercitar o estilo e tirar das trevas minhas letras tão esquecidas, porém queridas. Vê? A rima é pobre. A imagem é fraca. Provavelmente o que te move sobre estas letras é algum sentimento pela pessoa do autor. Amizade? Carinho? afeto? Esqueça tudo isso. O texto não quer sua piedade. Leia-me como texto, não como gente. Não sou gente. Sou palavra, verso, sílaba, sintagma cáustico cortante. E se o autor lembrou-se de mim e comentou a minha existência, é porque ele não tem existência própria. É ele que precisa de mim. Por isso, tenham pena dele. E tenham, aí sim, piedade de mim e parem esta leitura já! Como não adianta advertir, tomo eu a iniciativa e me findo cá.